Relevo, clima e volume de tráfego influenciam casos, dizem especialistas.
Maior tragédia rodoviária matou 51 ocupantes de ônibus há uma semana.
Relevo acidentado, grande movimentação de veículos por conta do turismo e transporte de mercadorias e as características do clima são fatores que contribuem para a recorrência de trágicos acidentes em Santa Catarina, afirmam especialistas. Há também críticas às condições das estradas. No último sábado, as rodovias do estado tiveram seu maior desastre com a queda de um ônibus de turismo em uma ribanceira de Joinville que deixou 51 mortos (veja ao final um histórico com os principais acidentes ocorridos em SC).
O trecho da SC-418, onde aconteceu o acidente, fica na Serra Dona Francisca, uma das cinco regiões consideradas mais críticas pela Polícia Militar Rodoviária (PMRv), que atua nas rodovias estaduais. Só em 2014, o trecho que vai de Joinville a Fragosos registrou 126 acidentes com vítimas – foram 186 feridos e 16 mortos. No total, nos 4.600 km de estradas estaduais, o ano passado teve 4.508 acidentes com vítimas - 6.009 feridos e 391 mortos.
A pedido do G1, a PMRv propôs um mapa com as cinco regiões onde foram registrados os acidentes mais graves de 2014 nas estradas estaduais, com as características econômico-geográficas de cada área. A polícia não divulga dados específicos como os trechos exatos onde há mais acidentes com vítimas nem o ranking das rodovias mais críticas:
Norte: Tem relevo bastante acidentado e grande circulação de caminhões por conta do porto de São Francisco do Sul. É cortada pelas estaduais SC-110, 415, 416 e 418 (local do acidente) e pelas federais BR-101 e 280
Vale do Itajaí: Região de vale onde ocorrem grandes festas como Fenarreco, Oktoberfest e Festa Pomerana, que atraem milhares de turistas anualmente. Tem como característica a presença de rios e é bastante urbanizada. Há trechos que cortam cidades com bastante movimentação de pedestres. A região tem as estaduais SC-108, 110, 421, 412 e 414 e as federais BR-477, 470 e 101.
Sul: Próxima ao RS, a área é caracterizada pela produção de carvão e tem tráfego intenso de caminhões. É cortada pelas estaduais SCs-100, 108, 370, 390, 441, 443, 445 e 446 e pela federal BR-101.
Grande Florianópolis: Recebe um grande número de veículos. Nos meses de verão, 1,5 milhão de turistas passam por Florianópolis na alta temporada. Por lá passam as estaduais SC- 401, 403, 404, 405, 406, 407 e 282 e as federais BR-282 e 101.
Oeste: Com forte indústria agropecuária, a região tem grande deslocamento de caminhões frigoríficos. É cortada pelas estaduais SC-157,159, 160 e 484 e pela federal BR-283.
As rodovias federais que cortam Santa Catarina também têm números preocupantes. Embora o estado ocupe apenas a 11ª posição entre as maiores malhas rodoviárias federais do país, com 2.619 km, é o 4º com maior número de mortes em acidentes, segundo dados de 2014 da Polícia Rodoviária Federal (PRF).
Santa Catarina registrou 537 vítimas fatais em acidentes nas estradas federais no ano passado, atrás apenas de Minas Gerais, Bahia e Paraná – estados com rodovias federais mais extensas, ocupando respectivamente a 2ª, 1ª e 6ª posições.
Condições das estradas
“As estradas catarinenses não são tão ruins na construção, mas o terreno não ajuda e leva a essa tendência de acidentes, mais que em outros estados”, diz José Bernardes Felex, professor titular de engenharia civil da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). “Economica e geograficamente, também está em uma posição que favorece acidentes, entre Rio Grande do Sul e São Paulo”, diz o professor.
Sérgio Pöpper, presidente da Associação dos Usuários de Rodovias de Santa Catarina (Auresc), discorda e atribui o problema à condição das rodovias. "Nossa malha estadual e federal está detonada. Há 40 anos trabalho como representante comercial dirigindo pelo estado e vejo que pouca coisa foi feita". Segundo ele, está sendo elaborado um abaixo-assinado para pedir melhorias como a colocação de guard-rails para veículos de grande porte e até mesmo muros de contenção na Serra Dona Francisca.
Para Camila Belleza, do Laboratório de Transportes e Logística (LabTrans), da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e que faz auditorias de segurança viária em trechos críticos de todo o Brasil, o local onde houve acidente em Joinville tem boa iluminação e pavimentação adequada. “Ali a estrada é de concreto, mais aderente”.
O secretário estadual de Infraestrutura, João Carlos Ecker, afirma que o trecho da Serra Dona Francisca foi construído com segurança. “Vamos melhorar a sinalização. Já estávamos fazendo as melhorias, mas infelizmente aconteceu essa tragédia.”
Segundo o secretário, 40% dos recursos do programa Pacto por Santa Catarina, lançado em 2012, estão sendo investidos na melhoria da malha viária estadual. Segundo Ecker, os investimentos em obras como duplicações, pavimentações e revitalizações devem chegar a R$ 4 bilhões.
As regiões com maiores investimentos previstos são as do extremo oeste, com R$ 1,09 bilhão, e norte, com R$ 684 milhões.
O turismo
O estado recebe visitantes o ano todo, de ônibus de excursões para grandes festas a turistas internacionais vindos de carro de países como Argentina, Uruguai e Paraguai. “Quando chegam a Santa Catarina esses motoristas já estão viajando há bastante tempo. Estão cansados”, diz o professor Felex.
O estado recebe visitantes o ano todo, de ônibus de excursões para grandes festas a turistas internacionais vindos de carro de países como Argentina, Uruguai e Paraguai. “Quando chegam a Santa Catarina esses motoristas já estão viajando há bastante tempo. Estão cansados”, diz o professor Felex.
O volume de tráfego
“Temos uma frota que só aumenta”, diz o major Fábio Martins, da Polícia Militar Rodoviária. “A SC-401 em Florianópolis, por exemplo, tem um volume médio diário de 60 mil veículos. No verão, chega a 90 mil”.
“Temos uma frota que só aumenta”, diz o major Fábio Martins, da Polícia Militar Rodoviária. “A SC-401 em Florianópolis, por exemplo, tem um volume médio diário de 60 mil veículos. No verão, chega a 90 mil”.
Para Alysson Andrade, chefe de engenharia do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit-SC), é necessário cada vez mais rapidez para a infraestrutura se adequar ao volume de tráfego. “Quando a Via Expressa da Grande Florianópolis, na BR-282, foi implantada, a projeção de tráfego era de 40 mil veículos por dia. Hoje estamos com 170 mil nas duas faixas”, afirma.
“O volume de tráfego intenso piora as condições. Uma rodovia é feita para durar dez anos, mas vai depender da carga que passa por ela e do volume de trânsito”, diz Hélio Goltsman, do LabTrans, da UFSC.
O clima
O clima subtropical, segundo o major Fábio Martins, também eleva os riscos em SC. “Há muita incidência de neblina, chuva, até neve. Tudo isso influencia na segurança.”
O clima subtropical, segundo o major Fábio Martins, também eleva os riscos em SC. “Há muita incidência de neblina, chuva, até neve. Tudo isso influencia na segurança.”
As características das rodovias
Alysson Andrade, do Dnit-SC, diz que Santa Catarina exige uma atenção maior dos motoristas que vêm de fora. “Temos condições de rodovias muito diversificadas, com grandes rampas e que exigem velocidades muito diferentes. Claro que as estradas precisam sempre de melhorias, mas é preciso respeito às leis de trânsito”, diz Andrade.
A chamada geometria das rodovias, com eventuais curvas, aclives e declines, também é um fator a ser considerado em Santa Catarina. “Se a curva é perigosa, ela não deveria existir. É um erro de projeto”, afirma o engenheiro sênior Hélio Goltsman, especialista em pesagem e movimento e pesquisador do LabTrans, da UFSC.
No local do acidente em Joinville, a velocidade máxima permitida para a curva onde o motorista perdeu o controle é de 30 km/h. “Com qualquer velocidade superior o motorista já não conseguiria fazer a curva”, diz o major Fábio Martins.
Segundo Goltsman, o excesso de carga causa desequilíbrio e afeta a dirigibilidade, além de desgastar freios e suspensão mais rápido. “Um veículo sobrecarregado é um catalisador de acidentes numa rodovia”.
“No caso do acidente de Joinville, é preciso avaliar várias questões: problema de geometria e ou pavimentação, se houve falha do motorista, se ele trabalhou mais de 24h, se houve problema mecânico ou não, ou ainda ser o conjunto delas”, diz o engenheiro de tráfego Ricardo Reibnitz.
A partir de depoimentos de sobreviventes, a polícia cogita falha mecânica como uma das hipóteses para o acidente. “Mas só com o resultado da perícia poderemos determinar a causa”, disse o delegado Brasil Guarani, da Delegacia de Delitos de Trânsito de Joinvile.
Histórico de tragédias
O estado tem um histórico de acidentes graves de ônibus. Só no ano passado, em Santa Catarina, a PRF registrou 493 acidentes envolvendo ônibus, com dois mortos e 126 feridos. O acidente que aconteceu na Serra Dona Francisca não foi o primeiro do ano.
O estado tem um histórico de acidentes graves de ônibus. Só no ano passado, em Santa Catarina, a PRF registrou 493 acidentes envolvendo ônibus, com dois mortos e 126 feridos. O acidente que aconteceu na Serra Dona Francisca não foi o primeiro do ano.
A PRF informou que realiza fiscalização em ônibus de linha regular e em ônibus de excursão, tanto sozinha, como em conjunto com o Deter e com a ANTT. Em 2014, a PRF reteve 1.643 ônibus irregulares no Brasil. Em 2015, até agora, 355 ônibus tinham alguma irregularidade.
Veja os acidentes mais graves da história de Santa Catarina:
12 de janeiro de 2000
BR-470
Um acidente envolvendo um ônibus, um micro-ônibus e dois carros em uma curva de serra deixou 42 mortos entre Pouso Redondo e Curitibanos, no Oeste catarinense. A maioria dos mortos eram turistas argentinos que iriam para o litoral catarinense.
BR-470
Um acidente envolvendo um ônibus, um micro-ônibus e dois carros em uma curva de serra deixou 42 mortos entre Pouso Redondo e Curitibanos, no Oeste catarinense. A maioria dos mortos eram turistas argentinos que iriam para o litoral catarinense.
9 de outubro de 2007
BR-282
Dois acidentes no mesmo local deixaram 27 mortos e mais de 100 feridos em Descanso, no Oeste. Um ônibus fretado que voltava de uma feira agropecuária se chocou com uma carreta. Cerca de duas horas depois, uma outra carreta perdeu o controle e atropelou equipes que prestavam socorro. Morreram neste segundo acidente um PM e um cinegrafista da RBS TV.
BR-282
Dois acidentes no mesmo local deixaram 27 mortos e mais de 100 feridos em Descanso, no Oeste. Um ônibus fretado que voltava de uma feira agropecuária se chocou com uma carreta. Cerca de duas horas depois, uma outra carreta perdeu o controle e atropelou equipes que prestavam socorro. Morreram neste segundo acidente um PM e um cinegrafista da RBS TV.
5 de março de 2011
BR-282
O choque entre uma carreta e um ônibus que levava competidores de bolão (espécie de boliche) do Rio Grande do Sul para o Paraná deixou 26 mortos também na cidade de Descanso, no Oeste catarinense. O motorista do ônibus foi uma das vítimas.
BR-282
O choque entre uma carreta e um ônibus que levava competidores de bolão (espécie de boliche) do Rio Grande do Sul para o Paraná deixou 26 mortos também na cidade de Descanso, no Oeste catarinense. O motorista do ônibus foi uma das vítimas.
22 de junho de 2013
SC-386
Um ônibus da empresa Transbrasil com 39 pessoas caiu em uma ribanceira de 40 m, em Mondaí, também no Oeste catarinense. Bombeiros levaram mais de 3 horas para resgatar as vítimas. Dez pessoas morreram - quatro no local e seis no hospital.
SC-386
Um ônibus da empresa Transbrasil com 39 pessoas caiu em uma ribanceira de 40 m, em Mondaí, também no Oeste catarinense. Bombeiros levaram mais de 3 horas para resgatar as vítimas. Dez pessoas morreram - quatro no local e seis no hospital.
11 de janeiro de 2015
BR-282
Um ônibus da empresa Reunidas que havia saído de Posadas, na Argentina, com destino a Florianópolis, saiu da pista e caiu em uma ribanceira em Alfredo Wagner. A maioria dos passageiros era do Rio Grande do Sul. O acidente deixou 9 mortos. Segundo a ANTT, o ônibus não estava autorizado a fazer o percurso. O caso segue sem conclusão.
BR-282
Um ônibus da empresa Reunidas que havia saído de Posadas, na Argentina, com destino a Florianópolis, saiu da pista e caiu em uma ribanceira em Alfredo Wagner. A maioria dos passageiros era do Rio Grande do Sul. O acidente deixou 9 mortos. Segundo a ANTT, o ônibus não estava autorizado a fazer o percurso. O caso segue sem conclusão.
14 de março de 2015
SC-418
A maior tragédia rodoviária de Santa Catarina, e uma das maiores do país, aconteceu no km 89 da Serra Dona Francisca, em Joinville. Um ônibus de turismo de União da Vitória, PR, que iria para um evento religioso no litoral, cortou caminho por Santa Catarina e acabou caindo em uma ribanceira de 100 m. O acidente deixou 51 mortos e 8 feridos.
SC-418
A maior tragédia rodoviária de Santa Catarina, e uma das maiores do país, aconteceu no km 89 da Serra Dona Francisca, em Joinville. Um ônibus de turismo de União da Vitória, PR, que iria para um evento religioso no litoral, cortou caminho por Santa Catarina e acabou caindo em uma ribanceira de 100 m. O acidente deixou 51 mortos e 8 feridos.
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