Claudia Allen
O escândalo da Fifa tem dominado as manchetes em todo o mundo na última semana. Mas por que as alegações de corrupção dentro de uma organização esportiva importam para quem não se interessa por futebol?
Autoridades americanas acusam pelo menos 14 executivos da entidade máxima do futebol mundial de lavagem de dinheiro, suborno e formação de quadrilha para extorsão.
Os desdobramentos da investigação nos Estados Unidos e na Suíça se relacionam com sonegação de impostos, apoio a regimes controversos e supostas violações de direitos humanos.
Entenda por que as alegações são importantes:
De quanto dinheiro estamos falando?
A Copa do Mundo 2014 no Brasil rendeu US$ 4,8 bilhões (R$ 15 bilhões) em quatro anos – o evento gerou um lucro de mais de US$ 2 bilhões para a Fifa.
A Fifa é uma organização sem fins lucrativos – que, no entanto, mantém uma grande reserva de dinheiro, que contabilizada mais de US$ 1,5 bilhão em 2014 – baseada na Suíça, onde é isenta de impostos.
O lucro total da organização entre 2011 e 2014, de US$ 5,7 bilhões, não é tão grande em comparação com o de megacorporações – a Coca-Cola, por exemplo, que patrocina a Fifa, lucrou US$ 46 bilhões só em 2014.
No entanto, o lucro da Fifa é maior, na média do ciclo de quatro anos, do que o PIB de diversos países membros da organização, como a Guiné-Bissau e as Seicheles.
Não me importa onde a Copa do Mundo acontece
A Copa do Mundo é o evento esportivo mais assistido do mundo e recebê-lo é uma questão de orgulho e simbolismo para muitos países.
Em 2010, os sul-africanos aproveitaram a "Febre da Copa do Mundo" quando o evento foi realizado lá – o primeiro no continente africano.
Em 2006, o então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, escreveu que "nós da ONU invejamos a Copa do Mundo" por causa de seu apelo global.
Os russos também estão ansiosos para receber o evento em 2018, de acordo com a correspondente da BBC em Moscou Sarah Rainsford.
No entanto, os senafores americanos John McCain e Robert Menendez pediram que a Fifa "evitasse dar ao regime de (Vladimir) Putin o privilégio de receber a Copa do Mundo 2018" no contexto das sanções dos Estados Unidos à Rússia por causa da crise na Ucrânia.
Ter a autorização para realizar um evento esportivo deste porte pode ser visto como um apoio ao governo do país pela comunidade internacional. Por isso, mesmo quem não assiste aos jogos da Copa pode se interessar pelo processo seletivo.
Por que grupos de direitos humanos se importam?
A investigação dos Estados Unidos sobre a suposta corrupção na Fifa não cobre o processo que escolheu o Catar como sede da Copa do Mundo 2022, mas as autoridades suíças abriram um inquérito sobre essa seleção e a que apontou a Rússia como sede em 2018.
No entanto, as condições de trabalho de imigrantes no Catar foram duramente criticadas por muitos desde a decisão de escolher o país do Golfo para receber o torneio, em 2010.
Na semana passada, um gráfico no blog do jornal americano Washington Post, que comparou o número de mortes de trabalhadores imigrantes no Catar desde 2010 (por diversos motivos) aos números de mortes de trabalhadores em outros eventos esportivos internacionais, foi compartilhado em todo o mundo.
O governo do Catar rebateu as acusações com palavras fortes em um comunicado, negando que qualquer trabalhador tivesse morrido nos preparativos para a Copa.
Em maio de 2015, a Anistia Internacional afirmou que, um ano depois que o país prometeu melhorar as condições para os trabalhadores imigrantes, nenhuma das reformas havia sido implementada.
Um dos ativistas mais proeminentes sobre o tema – o CEO da empresa australiana de roupas de banho Skins, Jaimie Fuller – afirmou que a questão dos direitos e da segurança dos trabalhadores no Catar é "só a ponta do iceberg da Fifa e este assunto, sozinho, mostra claramente a negligência e a negação deles quando se trata de confrontar os principais assuntos do futebol internacional".
Mas eu não gosto muito de futebol
"O 'Fair play' (jogo limpo, em tradução livre) é uma parte fundamental do jogo de futebol", diz o website da Fifa.
A organização anticorrupção Transparência Internacional (TI) concorda e afirma, em um relatório de 2011 sobre a Fifa, que a corrupção não só prejudica na imagem do esporte como também pode comprometer seu papel de "espalhar os valores do espírito esportivo".
"Se uma organização esportiva é mal administrada, como é possível ter um jogo padronizado e justo? E se o jogo não é padronizado e justo, como podemos gostar dos esportes?", diz Deborah Unger, da TI.
De maneira mais ampla, a Transparência Internacional diz que a corrupção "prejudica todos que dependem da integridade das pessoas em posição de autoridade", sejam executivos do futebol ou líderes políticos.
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